segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

texto do meu diário


TRILHAS SONORAS E RETORNO
Chopin foi a trilha sonora dos meus 17 anos e atualmente quando o escuto volto no tempo. Era esplêndido, os noturnos ganhavam a noite levando-me com eles. Em linguagem de informática podemos dizer que Chopin é um ponto de restauração do meu sistema, uma ação que motiva um retorno do meu ser a um lugar aonde ele já esteve, permitindo que eu volte a "ser" o que já fui, ocupando por alguns segundos uma inteira condição psíquica passada. É muito provável que Tom Jobim termine sendo outro desses pontos de restauração e no futuro faça-me retornar para a atualidade com as suas músicas instrumentais.

Começa a execução do piano dos noturnos e volto à mesma janela, ao mesmo quarto, com um cigarro e xícaras de café, uma sensação impressionante que acho só ser possível ocorrer em mim. Eu sinto o gosto do café na minha boca novamente, o cheiro da canela que adicionava a mais nos cappuccinos. Nessa época tinha deixado de freqüentar escolas e atingido o ápice do meu comportamento anti-social. Vivia para mim mesmo como um animal livre e soberano, lia meus livros solitário e vivia meu mundo, um selvagem que nutria paixões puríssimas, obcecado como era com a nobreza dos próprios sentimentos. Nesta idade feri propositadamente o antebraço duas vezes causando queimaduras irreparáveis de terceiro grau; pequenas cicatrizes de 4cm de diámetro que meus amigos rockeiros de Teresina chamavam de scars. O abuso de entorpecentes era constante, gritava ouvindo Sex Pistols: no fun, my baby, no fun! Ou ainda: no future, no future, for YOU! Passava-se "nada" na minha cabeça como dizia mamãe.

Como será quando Tom Jobim fizer-me voltar aos meus 21 anos de idade? Eu tenho neste momento metade da complexidade que tive antes e teminarei com meu retorno não honrando ao maestro caso não me torne mais criativo e não irei. O que faço agora é ferir de morte a consciência daquele garoto que já fui. Ele jamais toleraria que eu abandonasse o curso de filosofia, pouco importa com o uso de qual argumento. Na certa entraria em um acordo quanto ao abandono do nosso antigo estilo de vida, jamais concordando, porém, com os resultados medianos e conseguintemente medíocres do curso de Direito, porque ele odiava o comum, o homo medius e perceberia que me condeno a isso. Ele sofria da síndrome de Erostrato e havia de se tornar grande nem se fosse como incendiário ou assassino, esse era o seu espírito.
Nunca fui tão inteligente quanto naquela época. Não porque tivesse conhecimento acumulado pelo estudo, mas porque desenvolvia com mais facilidade os dramas que apreendia nos romances. Podia compreender uma situação apresentada por um romance com grande nitidez e transferí-la para mim, sentindo-a em seguida na mesmíssima moeda. Como esquecer a leitura angustiante de Werther? Os contos completos de Virginia Woolf? As biografias de Heidegger (Safranski) e Sartre (Beauvoir)? Eu estava me preparando para viver como um intelectual deveria viver, procuraria os meus pares nas universidades para poder ser, finalmente, feliz. Era isso que se passava na minha cabeça. Era um artista e um filósofo. Iria morrer do mal dos artistas, morreria por ter o coração muito sensível à arte, à vida e à luta.E agora aos 20 anos quando entro para a faculdade de filosofia e descubro formas de dividir minhas experiências, abandono-a tentado como estou pelos valores artificiais adotados por minha família. Tento agora me comportar como um adulto, mesmo porque "a adolescência é o prisma pelo qual os adultos olham os adolescentes e pelo qual os próprios adolescentes se contemplam", como definiu um psicólogo brasileiro na Folha de São Paulo. Como um adulto tento engolir o sentimento profundo de desgosto que é para mim não fazer mais aquele curso e ter fé que terei sorte em arrumar um emprego na capital (como advogado) e puder viver longe da minha cidade natal onde a sociedade acha-se ainda mais barbarizada e distante do modelo que busco para mim.


Carta que enviei ao penalista Rogério Greco

Senhor Rogério Greco,


Sou estudante de Direito do segundo ano, chamo-me Patrick Dantas, tenho vinte anos e moro na cidade de Teresina, no estado do Piauí.

O motivo desta carta está relacionado com a citação feita pelo senhor, do autor Muñoz Conde na página 62 do livro Curso de Direito Penal Parte Geral, segue in verbis:

“(...) e, por último, deixando, em princípio, sem castigo as ações meramente imorais, como a homossexualidade e a mentira”.

A citação foi feita pelo senhor como meio explicativo do princípio da fragmentariedade do Direito Penal, levando-nos a concluir que a homossexualidade não deve ser tipificada como crime porque não é uma ofensa grave o bastante a nenhum bem jurídico tutelado, devendo o Direito Penal não cuidar dessa imoralidade, nos termos do autor citado.

Eu sou homossexual desde minha adolescência, quando descobri minha orientação sexual. Desde sempre lutei pelos meus direitos no meio da minha sociedade e da minha família. Sou conhecido pelos meus amigos como uma pessoa ajustada e com uma capacidade exemplar de realizar juízos de natureza moral.

Pessoas como o senhor chegam a conclusões sem o correto cuidado, sem atentar, por exemplo, aos motivos pelos quais a homossexualidade é uma constante no comportamento sexual humano. Dados revelam que entorno de 10% das pessoas tenham algum grau de desejo sexual pelo mesmo sexo. Atualmente as pessoas estão evoluindo os seus conceitos e a sua moral para compreender que os que desejam o mesmo sexo não são doentes, nem imorais, fazem parte de uma manifestação natural da sexualidade humana, comum a sua existência. É uma questão de Direitos Humanos, inclusive. O CID-10 das Nações Unidas não mais considera a homossexualidade como doença. No Brasil desde 1985 o Conselho Federal de Medicina não considera homossexualidade como desvio sexual.

Conheço a relação ideológica que o senhor possui com a religião cristã, especialmente a protestante. Tinha o senhor como meu jurista favorito na área de Direito Penal mesmo não estando de acordo com a sua convicção religiosa e com as invasões que ela faz no seu texto. Para mim a religião como fonte de conhecimento ou de moral foi banida há séculos pela consciência de real ciência e independência dos valores. Espero que o fato de o senhor considerar a homossexualidade uma imoralidade não esteja relacionado com a sua fé, isso seria grave demais.

Este seu livro é do ano de 2008, a mais recente edição. Decidi cortar com o senhor e não mais adquirir nenhum livro seu desde que li a citação, pois temo que ao longo da coleção encontre algo ainda mais chocante. O Brasil tem excelentes penalistas e eu não preciso me sujeitar a isso. É um absurdo e contrasta seriamente com a atualidade um comentário dessa natureza. Sugiro ao senhor que diversifique as suas fontes, que procure se desmembrar de qualquer preconceito e descubra o que é a homossexualidade para o gênero humano e passe a tratar os homossexuais ao menos com respeito.

Patrick Dantas Lima

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

O curso de filosofia


O nome do blog ainda é filosófico, mas um marco na minha vida faz-se agora quando abandono o curso de filosofia da UFPI, que sonhei em fazer, e continuo somente com o de direito.

O meu primeiro contato com a filosofia foi com um livro didático do ensino médio, depois vieram outros livros, O Mundo de Sofia de Jostein Gaarder, os romances de Sartre, as principais obras de Nietzsche, os textos teóricos dos principais filósofos. políticos. Minhas paixões de adolescente foram vivenciadas lado a lado com a filosofia, meus amigos realçavam isso se deixando influenciar pela mesma volição de desejo e de literatura. A atitude do filósofo de Rembrandt, contudo, faltou em mim: contemplativo, pensativo, submerso, estático, também famosa em Sócrates que teria ficado por horas filosofando às vésperas de uma batalha. Eu gostava era de comunicar a leitura com minhas experiências epicuristas. Tudo era justificativa para uma experiência mais intensa dos sentimentos apreendidos nos romances.

Preparei-me toda uma vida para estudar filosofia e agora me vejo obrigado a adiar mais uma vez porque não acho que seja possível estudar dois cursos e ter condições de ser competitivo em uma área como a de direito em que é exigido muito estudo sistemático, cansativo e uma memória de elefante, principalmente agora com a concorrência alta pela abertura cada vez maior de faculdades. Tenho dúvidas sérias quando me pergunto se sou realmente capaz de destacar-me dos outros, como sempre sonhava, em uma vida acadêmica exemplar. O curso de Direito em que fui enfiado contra a minha vontade aos 19 anos agora já está em metade do seu caminho e nunca fiz nada mais do que ser um aluno regular. As horas de estudo necessárias para um destaque maior ainda me produzem tédio e enfado, quando não me escapa a concentração por qualquer motivo. Atualmente abandonei o sex, drugs and rock, mas a loucura da dedicação compulsiva e incomum aos estudos não veio como conseqüência natural. Já estou buscando o meu lugar na base, acomodando-me a ele, esquecendo qualquer vontade de atingir grandes metas, lançando esse desejo e essa vontade na fogueira de delírios adolescentes que pouco a pouco deixo para trás.

Minha identidade com o Direito é pequena, comparada à identidade que tenho com a filosofia, o contraste a deixa ainda menor. Certamente a Ciência do Direito é uma ciência imensa, uma das mais marcantes características da evolução de nossas sociedades é o nosso Direito. Mas o que se exige dos estudantes de direito e de seus aplicadores é capacidade técnica de levar à diante um complexo grupo de ritos, procedimentos, formalidades e finalidades que caracteriza o ordenamento jurídico e a aplicação efetiva do Direito. Mesmo com os avanços pós-positivistas, uma reabilitação dos valores, da discricionariedade, a maior dificuldade no Direito continua sendo a simples realização da correta subsunção do fato à norma. As normas, estas o aplicador deve conhecer e a única maneira é promovendo a leitura exaustiva das leis. Há pouco o que se fazer a não ser se tornar um excelente burocrata. A questão é: de que serve a alguém conhecer as leis? O conhecimento da Lei aumenta, ele completa? Isso eu não sei, mas quanto ao conhecimento de filosofia, isso eu sei dizer com certeza: filosofar é aquilo que se deve fazer imediatamente após se perceber enquanto vivo.




(continua)


domingo, 9 de novembro de 2008

procurando a espada do meu salvador



Este tópico está aqui para que o meu salvador leia. Assim como o messias dos judeus, existem relatos tão antigos quanto o tempo sobre as suas características principais e é preciso que ele se encaixe nessas previsões milenares para que eu possa perceber, ou melhor, para que o destino me possa fazer perceber que Ele chegou. O texto pode provocar esse destino.

Não existe nenhuma previsão sobre a aparência do meu messias. A tradição conta, contudo, que ele será capaz de me fazer perder a dificuldade que tenho para produzir tudo o que meu intelecto é capaz de fazer. Terá gostos semelhantes aos meus, e passaremos dias inteiros juntos discutindo sobre livros, cinema, arte, filosofia, humanidades e direito. Saberá cantar todas as músicas que sei cantar e recitaremos poesia juntos. Ele será inteligente e liberal. Sua presença na minha vida fará com que eu chegue aos meus objetivos maiores: construir uma carreira de intelectual engajado. É possível que Ele queira a mesma coisa para a sua vida, mas a tradição nisso não é certa, afirmando apenas "o destaque absoluto do messias em tudo o que se dedicar".
O meu herói e salvador messiênico está em algum lugar por aí. Basta esperar por sua chegada.



sexta-feira, 19 de setembro de 2008

O Ateneu, releitura e capas

O segundo livro que decidi comentar (ver postagem anterior) é uma obra nacional: O Ateneu. Achei-o à venda em uma banca de jornal por cinco reais. Edição simplíssima, de folhas finas, aproveitadas nas margens até as últimas consequências, com uma pintura do artista russo Valentin Alexandrovich Serov como capa. É uma releitura, o romance fez seu marco nos meus 13 anos.

O romance e o começo da minha juventude se confundem. Lendo-o, agora, quase ressuscito o garoto que fui, reativando aquela antiga subjetividade de sonhador, de alienígena, de estrangeiro. Para o protagonista Sérgio o Ateneu é uma crônica de saudades, da mesma maneira o é para mim. Agora releio o livro e sinto as antigas paixões que sentia, o romance acabou por se tornar uma maneira de recordar sentimentos do passado.

Um pouco sobre a capa da minha edição:

A imagem de capa da minha edição é uma pintura que retrata dois meninos na sacada de um prédio a observar a costa. O primeiro garoto admira a paisagem, enquanto o segundo observa o espectador, um pouco de soslaio. A imaginação, personalidade, universo e comportamento infantil acabam por ser centro da pintura. Boa parte da graça está nas personagens em cena, como de costume em Serov que é capaz de manter uma técnica exemplar nos cenários ao mesmo tempo em que cria expressões complexas nos seus personagens. Tanto a observação elegante que o garoto faz, com a mão no queixo, quanto o céu à frente dois mantém o mesmo nível de expressão em complexidade.

Decidi pesquisar e descobri que uma outra edição nacional adotou a gravura de uma edificação escolar. Entre a edificação e o Serov, prefiro o segundo. A gravura de uma edificação escolar à moda do prédio do Ateneu teria deslocado minha atenção dos alunos para a escola, de Sérgio (protagonista do romance) para o Ateneu. Ou seja, teria me atentado menos nas construções psicológicas menores e mais no ambiente microssocial da instituição, e desligado-me ainda mais das crianças e jovens que constroem, com sua criatividade, a realidade interna das instituições de ensino.

Uma outra capa que encontrei traz uma pintura que retrata um grupo de garotos, com idades diferentes, envolvidos na leitura de um bilhete que o mais velho traduz em voz alta. Não reconheço o artista, mas chego a sugerir que é provavelmente do começo século XX e atirando realmente às cegas, notavelmente realista. Seria adequado para a capa de um livro de Dickens. A condição social desses garotos é muito diferente da que temos no Ateneu e as roupas que eles usam revelam que são garotos libertos, soltos no mundo.

(..)

Termino com os comentários sobre as capas do Ateneu por aqui, o tempo que passei longe do blog, por força maior, fez com que me distanciasse demais das anotações que tinha sobre o livro. Minha memória das impressões do mesmo também já fugiram. Quem sabe reabra este tópico no futuro. Com o avanço no estudo de filosofia aos poucos me tornarei ainda mais capaz para criticar literatura, o que pode fazer da pausa uma boa medida.

Contudo, posto algumas anotações sobre as personagens que tinha no meu caderno, sondagens não muito profundas, assumo. Com o tempo melhorarei. Invejo os estudantes de psicologia, por exemplo, porque as técnicas de análise permitem um estudo mais apurado de personagens da literatura (assunto que pretendo fazer virar uma postagem em breve), mas como faço sempre nessas horas, repito a mim mesmo que sou filósofo e aí que deve residir a minha graça. A meu favor também conta um princípio vingente desde os idos iniciais da arte moderna: a liberdade cada vez maior do intérprete. Aí vão as anotações:

"Aristarco: imenso pedagogo, hipócrita, autoritário, mantém o jovem Franco em constante humilhação. (...) Na sua aula sobre astros, Sérgio faz uma analogia entre as mãos de Deus e as de Aristarco ao mover os planetários". "moralista, faz longo discurso sobre a moral" "representa a decadência moral da sociedade de então, seu falso moralismo". (...) "lê livros com as notas dos alunos em ritual aterrador" (...) "é representação da pedagogia de então"

"Sanches: que já é púbere, pede beijo a Sérgio" "Sérgio o repreende e termina a amizade, começando um longo declínio em suas notas que dependiam da ajuda de Sanches" (...) Aristarco lê em humilhação pública: "Sr. Sérgio tem degenerado" Sérgio compara Aristarco a Zeus."

Franco: Aristarco o chama de "o porco, o grandíssimo porco"

"filho de Aristarco se nega a apertar a mão da princesa, é republicano como o autor"




(suspenso)

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Retorno à literatura, anotações sobre J.Verne


Abandonei a literatura universal por quase dois anos. Agora voltei a ela e decidi novamente cumprir a meta de sempre possuir um romance em mãos e ler tantos quantos forem possíveis entre uma e outra atividade das faculdades. A maior dificuldade será financeira, não sei como comprarei tantos livros. Por isso, não poderei cometer o capricho de os escolher a dedo -- lerei os que a sorte lançar para mim.

Abusarei das bibliotecas das universidades, dos colegas, dos livros eletrônicos, recorrendo raramente às livrarias. Que seja, como disse Júlio César antes de se dirigir à Roma: "alea jacta est". A sorte está lançada!


As anotações:

O primeiro que caiu nas minhas mãos é proveniente de um furto no qual fui partícipe, instigando um amigo a roubar o acervo de sua escola particular de nível médio. Trata-se de A volta ao mundo em 80 dias, de Júlio Verne.

É uma vergonha, confesso, que este livro tenha caído em minhas mãos somente agora. É dessas leituras básicas que devem ser feitas aos quinze anos.

Vários livros de Júlio Verne foram adaptados para o cinema, desde o começo da sétima arte até recentemente. Muitos de seus romances possuem elementos que são característicos do cinema, como a aventura e a ação. Perseguições, combates à mão e arma de fogo, infiltrações, e outros eventos que requerem descrições voltadas para o desenrolar físico da ação, são presentes em suas obras, e em muitos autores que aparerentemente o influenciaram, como Alexandre Dumas (pai). A literatura americana é mesmo um filho direto da literatura inglesa, quem sabe essa linha de descendencia não chegou até o cinema americano?

Phileas Fogg (protagonista do livro) é muito bem caracterizado por este diálogo, que se passa na Índia inglesa, no meio de uma floresta, quando seu grupo decide resgatar uma moça que seria sacrificada em um ritual de adoradores da deusa Kali:

-Ora, o senhor tem um bom coração! -- disse sir Francis Cromarty

-Às vezes -- respondeu simplesmente Phileas Fogg. -- Quando tenho tempo.

Fogg é um autômato. Um espírito das "ciências exatas", positivista talvez. Cumpre horários regularíssimos, inspirados nas badaladas do imenso relógio da sua sala. É também um misterioso (parte de seu mistério a trama nem soluciona), não se sabe a origem da sua fortuna, como conhece tantos detalhes sobre geografia e navegação, nem tão pouco quais sejam seus familiares. É anti-social. Frequenta um único club londrino, o Reform Club, onde lê os jornais diários, almoça e joga uíste até próximo da meia-noite. Por mais discreto e distinto que seja, é suspeito de ser autor de um furto milionário no banco nacional.

É no Reform Club que se envolve com a aposta, central para a trama de Verne: dar a volta ao mundo em 80 dias, sem um minuto a mais e nem um minuto a menos. O londrino pretende executar o intento fazendo uso dos meios de transponte da época: navios e linhas férreas. Termina por utilizar também infinitos meios alternativos como paquetes, iates, embarcações comerciais, trenós e elefante.

Contra o inusitado inglês contam fatores como: concordância milagrosa das horas de partida e chegada, a possibilidade de quebras das máquinas, de tempos ruins, de neves, descarrilhamentos ou imprevistos de qualquer ordem que significariam atrasos capazes de por tudo a perder. Além disso, procurado pela polícia em todos os continentes, o inglês terá que despistar um polícial em seu encalço, o agente da polícia metropolitana "inspector Fix".

Logo no início do livro somos apresentados a Passepartout (traduzindo: pau-para-toda-obra) que será seu criado e ajudante toda a viagem. Antigo malabarista de circo, Passepartout defenderá seu patrão com o uso de seus dotes físicos; é também um desastrado, será parte do fator sorte a contar contra Phileas Fogg em toda a viagem.

Logo percebemos que estamos em uma corrida contra o tempo e que o enredo será curto, ágil, e que as expectativas do leitor voltam-se quase completamente para a incerteza da realização ou não do feito por Phileas Fogg e das peripécias que se envolve no caminho. Os personagens são divertidos, inusitados e os dialógos bens construídos; contudo é bem diferente de romances mais calcados na trama e nas personagens. Verne não é estudioso do psiquismo humano, suas atenções voltam-se para o imaginário e a aventura. Os cenários são importantes, mas o livro não possui descrições alongadas dos mesmos, com grandes detalhes geográficos. Elas existem, mas não são o centro do romance, como se pode acreditar pelo título do livro. Elas cumprem apenas o seu papel. Colônias e ex-colônias britânicas serão cortadas rapidamente, onde se passarão os principais eventos do romance. É um mundo interligado pela indrustrialização, colonialismo e pelas máquinas à vapor.

Indispensável para qualquer pessoa que pretenda conhecer ao menos as bases da literatura universal, Verne e a Volta ao Mundo é uma leitura mais que prazerosa, confiram.

domingo, 17 de agosto de 2008

O ator favorito

O ator favorito não foi uma escolha que fiz através de justificativas extensas, por isso não procurem forte embasamento crítico na minha escolha por Anthony Hopkins, meu favorito desde sempre.

De lá para cá meu senso crítico evoluiu bastante, passei a assistir filmes americanos por puro entretenimento e apego a sua linguagem de fácil compreensão e reprodução, mesmo assim, Hopkins continua a despertar o mesmo fascínio de quando lhe admirava com meus olhos de púbere. É como a primeira paixão.

Os mais eruditos escolhem atores do cinema clássico, do cinema europeu ou ainda do cinema independente. Eu escolho um do cinema popular americano porque nunca deixei de apreciá-lo e de ressaltar a sua qualidade maior: ter como espectador o grande público. É inegável que a linguagem hollywoodiana precisa se reformar da mesma maneira como é inegável que produziu grandes filmes. Minha escolha, Anthony Hopkins, é a escolha de um ator com relativa visibilidade que contagiou as massas e parte dos críticos com os seus trabalhos.


O Oscar para
Anthony Hopkins veio com O Silêncio dos Inocentes. Grandes papéis, claro, foram Picasso, Charles Dickens e Nixon em três filmes biográficos; o mordomo workahollic no filme The Remains of the Day (o mordomo obsessivo era um dos atributos impagáveis do excelente filme de James Ivory) e o médico Frederick Treves no filme O Homem Elefante de David Lynch (1980). Sem falar, claro, das suas inúmeras participações como ator coadjuvante. Dos filmes mais recentes com Hopkins, admiro especialmente Hearts in Atlantis, com roteiro baseado em Stephen King.

Com uma seriedade inconfundível, Hopkins sempre atribui maior profundidade a seus personagens, dando-lhes um pouco do seu natural mistério. Sua voz é fascinante. Seus olhos sempre parecem fitar alguma coisa além no espaço. Estilo inconfundível, inspira admiração, como aquela que temos quando estamos na frente de um grande sábio. Procuro assistir qualquer filme que o tenha escalado no elenco.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

O idealismo de Platão e a Beleza


Este trecho de Platão é especial para mim. Observar a beleza fora das formas conhecidas é o sonho de qualquer humanista, como o de qualquer artista ou filósofo.

Eis o trecho:
Simpósio, 211

"que pensar, então, se fosse dado a alguém ver o belo em si, íntegro, puro, sem mescla, e pudesse mirar não uma beleza contaminada de carne humana, de cores humanas e tantas outras frioleiras mortais, mas a própria beleza divina invariável?"


continua:
"não compreendes que somente nessa altura lhe será dado, mirando a Beleza pelo meio certo de mirá-la, dar a luz não simulacros de virtude, visto que não está em contato com um simulacro, mas virtude verdadeira, pois está em contato com a Verdade?"

sexta-feira, 8 de agosto de 2008

Meu lado oriental


Eu sou filótsofo e por isso profundamente ligado à cultura ocidental, vivo submerso na mais profunda tradição clássica. Leio filósofos gregos o dia inteiro. Sou discípulo de Platão e de Aristóteles.

Contudo, sempre guardei o devido espaço para o Oriente e já o deixei influenciar meu pensamento muitas vezes. Li os principais autores japoneses e já li alguns chineses contemporâneos (estes mesmos que vivem o drama da abertura do país). O nipônico Yukio Mishima quase me inspirou um suicídio aos 16 anos com o seu livro O Templo Dourado. Os mangás e animes japoneses me marcaram também, para mim são melhores que os comics americanos. Se um dia eu produzir qualquer literatura, terei em Mishima e nos mangás uma inspiração notável. Meu mangá favorito é EDEN.

Os orientais nos ajudam a entender a nós mesmos. Eles são puros, principalmente, puros da cruz, foram pouco tocados pelo cristianismo. Os séculos que nos separam deram a eles uma identidade individual e social muito diversa. Só recentemente foram integrados à tradição das instituições políticas greco-romanas, eles servem de estudo comparativo quando se procura saber o que realmente é o humano.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Na parede da memória!


Estamos em 2008. Para muitos homossexuais vive-se no ano de 1968 em que as pessoas simplesmente não podiam se tocar na rua. Os homossexuais são proibidos de demonstrar afeto em ambientes públicos e as expressões que acontecem ainda escandalizam. Eu sou homossexual, já sofri barras imensas por causa disso. Ainda hoje somos um grupo muito incompreendido, perseguido e preconceituado.

Quando em 1970 Belchior escrevia sua música chamada "como nossos pais", eternizada na voz de Elis Regina, ele denunciava o fato dos jovens não poderem expressar afeto livremente. Naquela época se vivia as transformações nos valores sexuais. Era um pedido por liberdade, em um tempo em que as relações dos jovens heterossexuais eram barradas e proibidas. Uma luta contra o falso-moralismo.

"Para abraçar seu irmão
E beijar sua menina na rua
É que se fez o seu braço,
O seu lábio e a sua voz..."

O comportamento da maioria dos jovens homossexuais ainda é esquivo e extremamente cuidadoso, evitando espaços públicos sempre. Isso ocorre também nos arredores da escola e em suas casas na presença de suas famílias. É um jogo de gato e rato que prejudica a todos nós que somos gays, criando guetos urbanos, medo, acrescentando pólvora à nossa adolescência. E confusos, muitas vezes nossas famílias não conseguem nos ajudar, o resultado final disso pode ser uma tragédia. Abertamente ou de forma velada, as famílias e comunidades toleram e até incentivam a discriminação, o abuso e a violência contra homossexuais. Como relatado em uma publicação científica recente do GRUPO PELA VIDA/SP, "o adolescente homossexual vive o segredo doloroso, a incompreensão que oprime e discrimina. Como não é acolhido, inicia suas atividades sexuais de maneira clandestina, correndo riscos maiores de se expor a problemas típicos dessa idade, incluindo drogas, suicídio, violência"

Se estamos em nosso Maio de 68 então devemos nos comportar como tal e passar a lutar pela presença da homoafetividade em qualquer ambiente. Não há nada de escandaloso ou imoral na relação de dois jovens do mesmo sexo. A homossexualidade é uma constante humana, uma forma legítima de expressão da afetividade e da sexualidade. Não é justo que os jovens homossexuais vivam a ancestralidade da moral, que proibia o namoro em público, enquanto os jovens heterossexuais gozam de todos os direitos de expressar publicamente seu afeto. Uma moral sexual justa e igual para todos é uma vitória de uma sociedade civilizada.

terça-feira, 29 de julho de 2008

SPY VS SPY (espionagem empresarial)

O buraco de Daniel Dantas é mais em cima. Os jornais têm se confundido e se agredido. Carta Capital acusou diretamente O Estadão e a Folha de terem agido a favor de Dantas em duas reportagens. FOLHA teria publicado informações sigilosas sobre a investigação de Dantas, ESTADAO teria tentado fazer de Dantas uma vítima de espionagens e conluios originados na Telecom Itália.

É fato que a Telecom Itália investigou Dantas e Dantas a investigou através da Kroll.
A procuradoria de Milão denunciou o grupo de Giuliano Tavaroli esta semana.

"mais talentosos no mister, os italianos não somente capturam o arquivo da Kroll, mas também a rica documentação em poder de Carla Cico, conterrânea a serviço do Opportunity. "

O final dessa confusão no Brasil será dificilmente a condenação de Dantas, o banqueiro conta com apoio político e conivência do STF. O que resta a Justiça é se concentrar em reaver o dinheiro, isso é mais importante que a prisão de Dantas, manter um homem preso não significa tanto para a coletividade quanto reaver o resultado de uma fraude milionária.

Um pouco mais sobre o orelhudo:

Época trouxe uma descrição dos hábitos e comportamentos de Dantas. O figurão já virou uma personagem, o interesse nele agora é também literário, a revista publicou uma imensa reportagem biográfica. Negociador brilhante e geniozinho desde os idos de faculdade, Dantas trabalha das 07 da manhã às 22 horas até nos finais de semana.

Sua carreira acadêmica foi descrita como meteórica. Formou-se na Bahia de onde partiu para Boston. Manteve contatos com célebres economistas no Brasil e no exterior. É famoso por trabalhar em pé, sentado e caminhando. Teria feito seu curso de pós-graduação sem interromper suas atividades como empresário graças ao tempo ganho dormindo em aviões e aeroportos.

Foi vice-presidente do Bradesco e no Icatu fez o patrimônio da instituição passar de Us$ 50 milhões para US$ 180 durante sua gestão. De lá para cá veio subindo na vida e participando de negócios envolvendo Brasília. O final da história: fraude e crimes financeiros. Sua história envolve políticos do período de FHC e Lula.

Resta agora saber quem será o novo figurão a ser desmascarado em mais um dramalhão público que irá terminar, graças ao sistema jurídico brasileiro, sem condenação em um processo interminável.

Os subversivos


"Os subversivos" é o nome que o jornalista J. Bernard Hutton deu ao seu longo ensaio jornalístico sobre a organização de grupos de atuação subversiva ao longo do mundo ocidental nos anos da Guerra Fria.

O livro publica documentos que revelam a participação de uma complexa organização burocrática no interior da antiga URSS para treinar e comandar ações grupais organizadas, orquestrando greves, assassinatos, atentados à bomba.

Os documentos trazem à luz a forma como Moscou tentou desestabilizar as democracias capitalistas ocidentais de dentro. Seja na Irlanda, seja nos EUA, seja no Brasil, seja na antiga Alemanha Ocidental, as ordens eram seguidas de acordo com uma política orquestrada a nível internacional pelo Kremlin.

Os partidos comunistas legalizados eram utilizados como ponto de reunião e recrutamento de subversivos que desligados do partido atuavam nas missões mais ostensivas. O livro foi publicado no Brasil durante a ditadura militar pela Biblioteca do Exército. As denúncias de J. Bernard Hutton foram usadas no nosso país para criar temor e pânico dos comunistas, servindo de justificativa para os crimes políticos cometidos pelos militares. Assim como vasta parte do acervo publicado pela Biblioteca do Exército neste período.

O que acho impressionante desta época é como os movimentos estudantis e revolucionários inundavam a juventude. A juventude que viria após 1968, seria a juventude extremamente mercantilizada que observamos hoje. A morte do discurso comunista acabou com as metanarrativas de vez. Se antes a juventude era facilmente desvirtuada pelo seu excesso de paixão, hoje o individualismo marcante criou uma legião de solitários.

Os documentos do Kremlin se referem assim aos jovens universitários: "os jovens começaram a experimentar novas sensações e ainda não aprenderam como controlá-las", "nos últimos tempos decidiram abandonar a ordem, a lei, e se engajar em militância". O Kremlin atuou na surdina durante manifestos e protestos estudantis nos EUA, qualquer descórdia com os governos era incentivada, fosse com a Guerra do Vietnã, fosse com as drogas do movimento hippie.

sexta-feira, 25 de julho de 2008

ateus, europa e eua

Nunca os europeus foram tão descrentes. A revista Veja publicou nesta semana uma reportagem sobre religião e política nos EUA e citou a europa como exemplo. Pesquisei dados sobre os europeus. Estatísticas publicadas no Financial Times sobre os franceses indicam o seguinte:

32% de agnósticos. 32% de ateus. 27% de crentes.

A mesma pesquisa aponta que somente 8% dos franceses vão à locais de culto com freqüencia. Outros países da Europa mostram dados semelhantes. Os dados ingleses eu encontrei em sites do governo: 23% são ateus. Na Holanda 29% são agnósticos ou ateus. Mas mesmo entre os crentes quase mais ninguém frequenta as igrejas com assiduidade na Europa.

Nos EUA os dados apontam um rumo completamente diverso do europeu e semelhante ao dos países pobres: 90% da população acredita em deus e 70% vai à Igreja com frequencia. Há dúvidas até da inflência da religião em matéria política. Obama e McCain citam Deus constantemente em seus discursos. Assim como o presidente Bush. Durante as eleições há sempre briga para conquistar os protestantes conservadores, os estrategistas de campanha acreditam que por eles se manterem organizados em sedes de culto são fáceis de se remobilizar para qualquer causa. Obama já foi alvo de diversos constrangimentos orquestrados a respeito de sua religiosidade, a confusão já fez 12% dos americanos acreditarem que ele seja mesmo seguidor de Alá.

In an west far far away....

(imagem do verdadeiro Wild Bill)

Na pequena cidade de Dallas, alguns anos após a Civil War americana, Stuart Heisler ambientou um dos seus melhores filme de faroeste. O nome é o Vingador Impiedoso (original Dallas). As filmagens são do ano de 1948. O astro Gary Cooper interpreta Blayde Hollister um coronel militar sulista que se tornou outlaw depois que os yankees venceram a guerra. Estranhamente, o outlaw é amigo do lendário Wild Bill Hickok, um personagem real que lutou heroicamente na guerra civil ao lado da União, participando de tiroteios fantásticos que deixaram uma lenda ao redor de seu nome.

A história se inicia com a busca do desastrado delegado federal interpretado por Leif Erickson por Wild Bill. As ordens de Washington são para o levar até a cidade de Dallas para investigar abusos de um trio de irmaõs conhecidos como "irmãos Marlow". Quando encontra Wild Bill, o delegado recebe uma resposta negativa e aceita o convite de Blayde Hollister para o substituir. Hollister tem também uma brilhante idéia de farsa: ir até a cidade de Dallas com papéis invertidos, Blayde fingiria ser o delegado federal e o delegado fingiria ser seu ajudante. Embasbacado com as habilidades de Blayde com a pistola, o delegado concorda com o plano.

A participação de Wild Bill é apenas especial, serve somente para introduzir o personagem protagonista Blayde Hollister que é fictício. Contudo, a introdução da trama, melhor parte do filme, conta com muitos diálogos com a lenda viva Wild Bill. Assistam.

terça-feira, 22 de julho de 2008

Que compara Teresina à Pasárgada


Teresina é minha Pasárgada. É aqui onde tenho tudo o que quero, é nesta terra onde conheço o Rei. Um Rei que sempre usa de sua coroa à sorte de meus caprichos.
como dizia Manuel Bandeira:

Vou-me embora pra Pasárgada
Lá sou amigo do rei
Lá tenho a mulher que eu quero
Na cama que escolherei

Vou-me embora pra Pasárgada

Aqui eu não sou feliz
Lá a existência é uma aventura
De tal modo inconseqüente
Que Joana a Louca de Espanha

Rainha e falsa demente
Vem a ser contraparente
Da nora que nunca tive....

Vou-me embora para Pasárgada!

quarta-feira, 7 de maio de 2008

Algumas linhas sobre cultura POP


Sem dúvida alguma PULP FICTION (Tarantino) é um dos maiores filmes já feitos pela indústria cinematográfica americana. Seu ano de lançamento foi o mesmo de Assassinos por Natureza (Oliver Stone com roteiro do Tarantino) e ambos pairam sobre o mesmo tema da violência gratuita que a indústria americana vende a preço de bananas. Em Pulp Fiction, Tarantino vai buscar na expressão mais vulgar de literatura as influências para o filme. Não tem como deixar de observar a linguagem hollywoodiana voltando-se para ela mesma, como metalinguagem ou estudo complexo de estilo. Observa-se com clareza todo o cinema da década, o cinema de ação, o cinema de aventura, e até o romance. Pulp Fiction é o único filme necessário para se perceber todo o cinema da década de 90.

Mesmo sendo um apreciador de arte muito crítico com a cultura POP, não deixo de observar os caminhos da indústria americana no cinema, na literatura e na música. Escritores de máxima vanguarda e eruditos, como Umberto Eco, já se renderam ao estudos dos elementos constituintes das modernas expressões artísticas da cultura POP. A Misteriosa Chama da Rainha Loana, seu livro mais recente, retrata a busca de um erudito desmemoriado pelas suas memórias de infãncia nos quadrinhos editados no início da indústria. Eu acho que devo mesmo prosseguir com cautela ao apreciar a arte de meu tempo, um canhão de muitas luzes que dispara em direção às tendências mais diversas.






quarta-feira, 30 de abril de 2008

Direito e Civilidade


Vencer as barreiras existentes entre nós em prol de uma sociedade mais justa, essas devem ser as diretrizes de qualquer governo. O brasileiro tem que se ser educado para o Brasil. Entender as diferenças existentes entre seus iguais, brasileiros, é o dever de qualquer brasileiro justo ou de civilidade. Eu sou um brasileiro com sentimento cívico, fui educado para o Brasil. Estou preparado para as diferenças raciais, de orientação sexual, sociais, físicas e de credo que esse país me impõe. Não pode haver civilidade em uma sociedade em que há exclusão, por isso o Direito justo é aquele que produz inclusão social e jamais exclusão. O Direito deve existir para permitir a socialização de todos, quem defende um Direito marginalizador é um falso jurista. O Direito justo é fator de civilidade. Nossas leis e políticas públicas devem buscar a construção de um sociedade em que o jogo social permita a revelação das qualidades individuais de todos, qual seja sua condição, com possibilidades reais de ascensão social através do mérito e trabalho.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Álvares de Azevedo e minha relação com a poesia


Não é à toa que eu conheço poetas e poesia. Eu tive uma educação no ensino médio voltada para os exames de vestibulares que cobravam Álvares de Azevedo quase sempre nas provas.

Hoje em dia, em homenagem a meu professor de filosofia e literatura do Diocesano, um irlandês da pele um pouco avermelhada que me falava do punk rock na Irlanda e dos cd's do U2, eu bebo com o Celso recitando os poemas do Álvares de Azevedo.

"Vivo sempre bebendo com o Celso, foi lá no São Pedro que eu renasci"

Isso é Aldir Blanc e não Álvares de Azevedo, mas com o Celso eu recito mesmo qualquer coisa.

Em um dos contos de Álvares de Azevedo, temos um estudante de direito que é tentado pelo demônio. Todos nós que somos bacharéis somos um pouco tentados pelo diabo, temos essa companhia e Álvares de Azevedo nos idealizava muito porque fomos nós quem inventamos as faculdades no Brasil.

A última mangueira que eu bebi com o Celso terminou assim:

"é tarde, amores, é tarde
uma centelha não arde
na cinza dos seios meus
por ela tanto chorei
que mancebo morrerei
adeus, amores, adeus!"

ou ainda esses outros versos de uma dessas suas personagens inspiradas nos sonhos de verão do romantismo europeu:


"toma dez bebedeiras: são dez anos.
quanto a mim tenho fé que a poesia.
dorme dentro do vinho. os bons poetas para serem imortais
beberam muito!"


Ou ainda esses versos sobre o Inferno:

"No Inferno estão suavíssimas belezas,
Cleópatra, Helenas, Eleonoras;
lá se enamora em boa companhia,
não pode haver Inferno com Senhoras!"

"se é verdade que os homens gozadores,
amigos de no vinho ter consolos,
foram com Satanás fazer colônia,
Antes lá do que no céu sofrer com os tolos"

segunda-feira, 24 de março de 2008

"toda nudez será castigada"


"Sou um menino que vê o amor pelo buraco da fechadura. Nunca fui outra coisa. Nasci menino, hei de morrer menino. E o buraco da fechadura é, realmente, a minha ótica de ficcionista. Sou (e sempre fui) um anjo pornográfico."

Nelson Rodrigues



quarta-feira, 12 de março de 2008

O rock and roll




O rock é um estágio da civilização humana, é um fato social e não pode ser negado. Nós somos viventes pós-presley, ou seja, o mundo se divide em antes e depois de Elvis Aaron Presley (se aceitarmos Presley como marco inicial para o começo do rock, podemos muito bem dizer que o rock começou com Chuck Berry).

O rock no começo da minha adolescência significava muito. Eu tinha pai-ausente (todo respeito a ele) e a identificação com ídolos se dá de maneira mais acentuada quando isso acontece durante a adolescência, terreno repleto de paixões. Dentre meus ídolos, o mais marcante é Sid Vicious.

Sid Vicious é com certeza a alegoria perfeita dos riscos que o rock trás para o adolescente, porque ser bom ou ruim, para Vicious, era uma questão de alteridade total, ele só podia ser mau com os outros, nunca com si mesmo. E nem ser mau com os outros o incomodava. Os valores, a vida, para Sid Vicious, não se justificava em lugar nenhum e conseqüentemente ele deveria celebrar o absurdo. O absurdo nos valores reza o seguinte mantra: tudo é possível, tudo é norma! Não há nada que diga que a norma vale pela norma, pois não há autoridade, nem fundamento último qualquer. A participação do sujeito no mundo não deve se reduzir jamais à aceitação de nenhum valor, nem que isso signifique a violência.

Bom, mas o que o rock realmente não tolera chama-se hipocrisia e mentira. Para o rock não podemos mentir para nós mesmos e nem para os outros. Por isso eu confundia a tendência natural das pessoas em se adaptar às normas sociais, quem sabe uma assimilação moral da norma, com o processo da hipocrisia. Durante a minha adolescência eu imaginava o adulto como um ser naturalmente hipócrita, manipulador e mentiroso. Eu devo ter passado bom tempo sem contar uma mentira. Seja nas escolhas mais simples, como a roupa que eu vestia, até as mais complexas como no momento de preservar a minha própria vida e intimidade.

"Roberto Caveira quer ser ruim com ele mesmo. Roberto Caveira é meu amigo, Roberto Caveira também é mala. Saia dessa Caveria você vai morrer tentando" Exemplo de silogismo simples.

Quem nasceu em 1987 mesmo encontrando um mundo livre para amar ainda tinha que mudar muita coisa. E eu fui mesmo desajustado, tinha mesmo meus motivos. Para mim só prestava com o meu desajuste quem não me conheceu deixou o mundo escapar porque eu sempre enxerguei mais longe. No mundo existe uma penca de cegos, são os coitados que me perderam no auge do meu problema porque eu dei conta de mim mesmo e do mundo com a minha porra-louquice.

"mas eu conheço cara mais PUNK do que eu e muito".

"o cara mais underground que eu conheço é o DIABO"


"Paulo Gerson não é ruim. Mas Paulo Gerson gosta de ser andrógeno de propósito. Paulo Gerson tem uma seta tatuada apontando para ."

"não fume maconha, se fumar, não fume todos os dias. Não cheire cocaína, se cheirar, cheire uma vez por mês. Só use LSD uma véz por ano. JAMAIS, JAMAIS, PIQUE".


SID VICIOUS matou a namorada dele com uma faca e nem se lembrava quando foi interrogado pelos delegados de tão bêbado que estava e tudo para morrer meses depois de tanto que a amava.

Para aonde era que EU ia adimirando este cara tanto quanto um padre admira Cristo?

Se eu tivesse caido nessa competição de punk eu tinha morrido tal qual algum dos meus ídolos. E eu realmente escapei.

Eu sempre disse aos meus amigos brincando:

"SID VICIOUS MORREU PELOS NOSSOS PECADOS E AGORA COMEÇA A NOSSA CIVILIZAÇÂO" SID DIE FOR OUR SINS.

Uma coisa é liberdade e outra é gratuidade.
Paulo Gerson ainda hoje não sabe a diferença entre os dois.
Paulo Gerson é gratuito enquanto eu sou livre, essa é a diferença.