
Terça-feira, 03 de março de 2009 .
Ao chegar ao apartamento percebi que no primeiro andar, logo a frente, havia uma festa muito movimentada ao som de rock and roll. Tocavam músicas do rock mais recente. Os risos, as conversas e o movimento inteiro da festa, fizeram-me lembrar da tentação de sempre que é abandonar os estudos e viver de farras. Tentado por essa idéia e pela falta de cigarros, decidi ir até um boteco no bairro ao lado do condomínio para comprar um maço e algumas cervejas para trazer para casa.
Enfrentei a chuva até lá com um guarda-chuva. O boteco estava com baixo movimento, todo na parte interna, sem as mesas da rua que são de costume. Não havia nenhuma mulher, somente alguns rapazes bebendo cerveja e jogando sinuca. Um era especialmente belo e realmente foi capaz de chamar minha atenção, observei-o desde que entrei. Sorriso carismático e aquele formato de cabeça característico de todos os rapazes belos., que forma uma meia lua em cima da nuca. Era o único branco.
Ao ver o dono do boteco perguntei quais cigarros ele tinha para vender, disse-me que tinha “carlton” e “hollywood”, além de algumas marcas que nunca fumo pela procedência duvidosa e péssimo gosto. Pedi uma carteira de “carlton” e perguntei sobre cerveja em lata ou longneck. Ele respondeu que não vendia nenhuma das duas, restando para mim a única alternativa de beber no bar. Aproveitei o fato para observar o comportamento dos rapazes que bebiam.
Sentei de pernas cruzadas, sem camisa, com o guarda-chuva ao lado da mesa. Na televisão passava um filme e pude reconhecer Halle Barry e Heath Ledger, e em poucos segundos mais, reconheci o filme, tratava-se de a “A Última Ceia”. Então perguntei ao rapaz mais belo da turma “nesse filme tem um condenado à morte?”. Ele respondeu que não sabia, o que para mim pouco importou, só queria que me dirigisse a palavra.
Ao longo da cerveja e dos cigarros que fumei, os rapazes comentavam sobre o filme, respondendo com expressões faciais e urros conforme as cenas fortes (como a de execução do condenado a morte) aconteciam. Percebi nesse instante, ao vê-los descontraídos, ocupados com as cervejas e suas conversas divertidas, o quanto a felicidade da vida está mesmo em momentos como esse, que são fáceis para eles de conseguir, bastam ir àquele bar e beber cervejas e conversar. Eu estava ali não como convidado, mas como espectador forasteiro, tentava compreender toda a beleza poética daqueles meninos envolvidos com jogos e descontração. Eu voltava da universidade do curso que nunca quis fazer, preocupado com a atividade financeira do estado, ou outra burocracia insuportável, enquanto aqueles rapazes voltavam de algum trabalho ou de uma escola pública. “O meu curso é uma morte, é uma morte lenta. Não chegarei a lugar nenhum”, pensei várias vezes. “Tenho agora com este diário poucos minutos de construção da minha personalidade, quando decidi escrever sobre o que vi e participei neste dia, decidi salvar a mim do comum a que me condenei. Como seria bom caso meus estudos contribuíssem para minha visão de mundo!”.
Tentava não observar seguidamente o rapaz bonito de que falei. Poderia pensar alguma coisa de mim ou estranhar que lhe olhasse, memorizei uma ou outra das expressões que achava que tinha de mais belo. Queria que falassem, queria que todos eles falassem e vivessem, que se divertissem. Eu tinha ali no corpo magro daqueles meninos morenos, com os contornos dos músculos esguios e ágeis, a poesia que perdi. Eles jogavam sinuca e se movimentavam provocando muita admiração em mim.
Paguei a conta e voltei para casa.

2 comentários:
engraçado (já q não há outra expressão)!
existe um quê de sentimentalismo no modo como vc escreve.
Excepcional, Mr. Dantas! Se pode haver poesia na prosa, ela deve estar em textos como esse, despretenciosos e ao mesmo tempo tão profundos.
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