A história que levou o Flamengo à conquista do seu hexacampeonato é uma dessas histórias fascinantes que só acredita quem tem costume com o futebol. O time iniciou o ano com uma campanha fraca e com a vitória de um carioca improvável para depois entrar no brasileirão tropeçando, com derrotas injustificáveis. Tudo indicava um caminho morno pela frente. Contudo, o time se acertou, ficou invicto por várias rodadas e ultrapassou os lideres no final da corrida sendo hexacampeão. A resposta para isso são quatro personagens.
O primeiro deles é Adriano, um rapaz deprimido que abandonou o dinheiro e a Europa para jogar no Brasil no clube do coração. Tudo muito bonito, mas daí a chegar ao país, entrar em forma, vencer a depressão e jogar futebol seria como uma vitória. Acabou sendo.
O segundo personagem é Petkovic, conhecido na Sérvia como Rambo. Esse voltou para o Flamengo em um acordo para cobrir dívidas. O então técnico do time, Cuca, recusava-se a escalar o sérvio discutindo com o presidente e ameaçando sair. Colocava o Rambo pra jogar no finalzinho. Petkovic virou a mesa, chegou de fininho, e passou a ser peça fundamental do time com gols épicos de bola parada. Agora é o deus do olímpico.
O terceiro personagem da história: Andrade. Monstro do futebol brasileiro e monumento da torcida rubro-negra, é uma espécie de ligação entre o passado glorioso do clube e o presente. Membro interino dos bastidores, Andrade assumiu a função de técnico porque não havia técnicos no mercado e terminou ganhando espaço com seus resultados. Agora a torcida tem duas dívidas com o Andrade, o jogador e o técnico. Pagar não vai nunca.
O quarto é tricampeão carioca, campeão da Copa do Brasil e do Campeonato Brasileiro. Escapou de uma amputação em uma lesão rara, voltou a jogar futebol e fez o gol do título em uma jogada ensaiada. É o que mais me emociona: Ronaldo Angelim.
Fui um flamenguista pessimista e analisei mal as coisas ao longo de todo este ano. Acreditei que Adriano no máximo dava bom exemplo de “pobre menino rico” com essa choradeira toda e que Petkovic estava velho e visivelmente fora de forma e que Andrade, com todo respeito, mesmo criado nos bastidores, não ia saber levar o time como técnico. E o pior, e sem perdão: Angelim não ia voltar a jogar futebol.
Fiz tudo errado, escalei outro time para jogar. Dei cedo o título para o Palmeiras. Eu penso com a cabeça e não com o coração. E futebol não tem sentido, se tem sentido é um sexto. Esse sentido, infelizmente, eu tenho pessimamente desenvolvido.
Hoje é aniversário dos ataques terroristas de 11 de setembro (por um defeito no programa a data da postagem está errada). No dia dos atentados cheguei mais cedo da escola e vi a televisão transmitindo ao-vivo as imagens da CNN. Pensei que era o fim do mundo ou algo assim. Eu tinha quatorze anos e voltei à escola, de bicicleta, para interromper a aula e contar a meu melhor amigo o que estava acontecendo. Narrei no corredor da escola, ofegante, o que tinha testemunhado em casa e que meu amigo desconhecia. Achava que ele precisava saber imediatamente. Éramos próximos e tínhamos idéias malucas juntos, consumíamos muita cultura americana nos filmes, nas músicas e nos livros.
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O mundo não ficou bem depois de 11 de setembro, mas minhas expectativas ainda mais pessimistas jamais se realizaram. Eu estava excitado esperando que minha vida pudesse vir a ter algo de heróico quando vi os ataques. Achava que chegaria até a cidadezinha onde morava todo ofrenesidaquelas torres caídas. Esperava que os EUA voltariam a recrutar civis para a guerra, jovens de preferência, como no Vietnã... Idéia infantil compatível com a minha maturidade na época. "Os jovens americanos irão morrer na guerra novamente". Os filmes que assistia e osrocksque ouvia eram influenciados pelos acontecimentos do Vietnã e ver um Vietnã acontecer seria belo. "Ah! Nem que pelos jornais e pela TV! Seria como em OFranco Atirador...".
Eu tinha raiva dos EUA e por acaso uma das professoras, colaborando, escolhera naquele ano um livrinho fino que falava sobre a influência cultural do país nos jovens a partir dos anos sessenta. Segundo muitos, o hamburger é o feijão com arroz dos americanos, confirmando a tese o livro tinha na capa um hamburger imenso que caia de paraquedas em um prato com a bandeira nacional do Brasil, anunciando que nos alimentávamos de uma cultura alienígena.
Sempre fui um formador de opinião, um intelectual, e o antiamericanismo seduziu muitos jovens com essas características durante o mandato do governo Bush, a começar pelo 11 de setembro, e eu não escapei a esse fácil destino. Contudo, a maturidade afastou-me de qualquer pensamento simplista em política internacional. Hoje em dia, como antes, não conheço os EUA pessoalmente, eles ainda são um monte de livros, filmes, internet, TV e "vida" que vem todos os dias mexer com a minha,mas diferentemente, tenho com eles agora uma boa relação, seja pela saída dos republicanos do poder, seja pelo simples fato de que sei muito bem que os EUA não podem ser culpados por tudo o que há de errado no mundo. Mesmo que pareçam ser o mundo todo, as vezes.
Quando o Senador Jarbas Vasconcelos (PMDB/PE) chamou o Bolsa Família de “esmola” foi rebatido pelo Presidente da República com o seu usual tom demagógico. O Presidente respondeu: “para um cidadão que pode dar uma gorjeta de R$ 100,00 em um hotel cinco estrelas isso não é nada, mas para uma mãe de família é dinheiro que na mão faz a multiplicação dos pães”.
Bom, o Lula é assim mesmo. Desde que assumiu o cargo tem falado para o povo com um estilo singular. Algo o fez acreditar que buscar uma linguagem simples garantirá sua aprovação e o crescimento do seu partido. Mesmo quando nomes de peso denunciam seu estilo de demagógico, ele mantém o tom: improviso, coração inflamado, choro, vale tudo para o Presidente da sinceridade. Tão sincero quanto seria um homem comum.
. Para quem não tem acesso a jornais, revistas e cultura, identificar um governo e suas falhas é difícil. Essa é a aposta do Presidente que sensibiliza os pobres transmitindo confiança não por fazer um bom governo, mas por não ter o mesmo rosto largo, de espertalhão, de larápio, que os políticos brasileiros educados, de classe alta, possuem. Ele é muito diferente de um senhor sem carisma que fala pausadamente (como Serra) ou de um senhor às vezes sarcástico demais, do riso confiante e ameaçador (como FHC). Lula é um operário que perdeu um dedo a serviço dos algozes, os patrões, que martirizam os trabalhadores. O mensalão foi incapaz de dar ao povo a imagem do Lula corrupto, ladrão e cheio de conchaves, imagem que temos de todos os políticos do Brasil independente da realidade.
Recentemente o Presidente foi recebido pela UNE com gritos de "Dilma presidente" e "Lula, guerreiro do povo brasileiro". A resposta foi a de um líder estudantil: "vocês vieram aqui para trabalhar ou para gritar?". Não há registro de outro presidente que tenha sido convidado para um congresso da UNE. Lula conta com o apoio dos estudantes que foram protestar contra a permanência de Sarney (aliado do governo) apenas após a saída do Presidente e sua comitiva de 11 ministros. A UNE recebeu do Governo Federal dez milhões de reais desde 2004, dentre os quais sete milhões nos últimos 14 meses.
O Presidente tem o governo avaliado como ótimo/bom para 69% da população e tem agido com arrogância chamando os senadores da oposição de pizzaiolos e dominando a fraca CPI da Petrobrás. Percebe-se que o Brasil não precisa mais de Congresso Nacional, basta o Poder Executivo, ele impõe o que quer ao legislativo o seduzindo promiscuamente.
Em 2010 seja qual for o vencedor haverá muitos pontos em comum, graças a herança do lulismo: o PMDB estará com o governo, haverá escândalos de CPIs, ninguém acabará com o Bolsa Família e o crescimento do PIB se chegar a 5% ao ano deixará a todos felizes reelegendo o vencedor para mais quatro anos.. Como disse John F. Kennedy, o segredo para o sucesso de um governo é a economia, mesmo que tudo, tudo o resto vá errado.
"Eu teria sido um aluno brilhante de filosofia, sociologia ou qualquer outro curso em que as exigências fossem as de um aluno com incomum capacidade crítica e destreza em se mover em meio aos campos teóricos de uma ciência. Sou forçado a ver com inveja as pessoas que tiveram a oportunidade que eu não tive ou a coragem que não assumi. Como o Eduardo que abandonou seu curso de direito na UESPI para apostar nas próprias escolhas, porque confiava em sua capacidade."
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"Isso é um desabafo. Não é necessário que você leia esta carta até o fim. Eu já abandonei as formalidades que textos dessa natureza exigem, quero falar com emoção, pois é o que sinto agora, angústia. Serei tão direto quanto O Apanhador no Campo de Centeio"
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"O curso de direito foi feito para qualquer aluno que tenha capacidade de recordar por meio de exaustivo estudo o que é textualmente exposto pelas leis. Existe em minha sala exemplos de alunos com essa capacidade, proveniente, como já pude perceber, da ambição profissional e da identidade com o curso. Eu não tenho identidade com o curso e não sinto nenhuma ambição profissional, o que me coloca em situação de larga desvantagem".
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"Eu deveria ter com o direito ao menos a esperança de atingir autonomia financeira, pois se ele não é um fim em si mesmo, poderia ser um meio para algo. Acontece que por detrás da realidade que ele significa, mora morto o único sonho que tive nesta vida: o de ser um intelectual."
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"Sou obrigado a continuar com o curso porque não me resta outra alternativa. Na minha idade não ter autonomia financeira começa a ser algo muito irritante. Sinto como se ele fosse uma armadilha a que terminei caindo. Não refiz a matricula de filosofia na federal, era impossível estudar para os dois ao mesmo tempo e as minhas notas no curso de direito diminuíam. Negam-se a me sustentar nesta cidade para estudar exclusivamente filosofia. Sou péssimo estudante de direito. Há algum lugar onde o patinho feio seja cisne? Estou deslocado."
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"Será que eu consigo dinheiro com essa droga?"
"O Direito Penal é uma forma de manter viva a consciência de dinossauros ocupados em fazer o que mais detesto na vida: falso-moralismo."
"Nunca foi ciência, parece-me técnica, ou mesmo puro know-how, mero conhecimento procedimental, savoir-faire."
Escrito em maio de 2004, tem como tema as impressões de colegial.
Ao contrário do personagem de Mishima, a que roubo o nome dessas confissões, não me lembro de ter fantasiado uma única vez, quando criança, as coisas que ele confessa ter fantasiado. Contudo, senti no peso do colegial as mesmas paixões disfarçadas em amizade que ele relata com tanto vigor no livro, daí a homenagem. Minha mais marcante imagem, da minha inebriante descoberta, a descoberta do erotismo, não fora uma imagem clássica, como São Sebastião de Guido Reni, mas a mesma confecção vulgar de pornografia que circulava pelos corredores da escola. O peso enorme de um estranho fascínio pesava sob minha cabeça; enganava-os fingindo participar do mesmo universo de descoberta sexual que eles (os outros garotos), e, como a personagem de Mishima, fui me tornando especial na arte de dissimular e fingir. Um senso de preservação e uma maldade desde aqueles anos passou a dominar minhas relações sociais. Nunca fui verdadeiramente bom, era muito marcado por um sentimento de autopreservação que me obrigava a ser ruim.
Amava os fortes e me aproximava deles a todo custo. Fui com os tempos marcando minhas relações de amizade com meninos frustrados, quase sempre agressivos. Mesmo os de beleza serena e angelical -- mais a frente falarei das minhas experiências com esses tipos -- conseguiam vencer o anarquismo e as expressões gratuitas de violência. Não gostava, nunca gostei do vigor físico exagerado, gostava dos pontapés e socos que viam de um corpo frágil, ágil, mais “ágil que forte”. Até as personagens ágeis dos desenhos animados eu amava. Essas experiências colegiais abriam aos poucos espaço para o começo da minha difícil relação com a autoridade e com o costume. Aprendi a odiar as autoridades, e os costumes, subvertia-os. Meus amigos de colegial, todos eu influenciava com minha atípica visão de mundo, e passavam todos a multiplicar o universo maravilhoso de literatura que eu fazia ser tudo o que estava ao meu redor, como o rei Midas convertia tudo em ouro, eu convertia tudo em mágica. São as pessoas criativas que deus pôs nele, as que eu disciplinei.
Mantinha contato excessivo com eles e a eles voltava minha atração sexual, por isso havia em mim mais intensidade na percepção do desejo e mais freqüentes momentos de descontrole, uma vez que não vivia distante do objeto admirado sexualmente, não havia separação entre o meu mundo e o mundo do meu objeto de desejo, como havia entre o deles e o das garotas a quem voltavam sua atração sexual. E nesse ponto aprendi a odiar e a afastar-me ainda mais do meio das meninas, nunca gostei nem do que lhes fazia referência, como roupas e sua fragilidade. Na infância a separação boba de papéis a que nos educam afastam-nos em pólos diversos, eu não tinha porque buscar reconstruir esses pólos, religá-los, se deixassem a mim em um internato como o Ateneu eu acharia ali meu verdadeiro lar. Ainda não deixei de as perceber (as mulheres) como seres deslocados do mundo, como alienígenas, observo-as com profunda admiração e sem saber de onde vieram e que propósitos possam ter nesta vida.
O que me deixava ainda mais deslocado era também a criatividade incomum voltada à objetos de arte, como literatura e a música. Havia dificuldade em comunicar o mundo apreendido na admirável literatura a que tinha contato e as experiências banalizadas de vida que os outros na escola adquiriam com os recursos que a educação de pouca qualidade lhes trazia. Eu queria fugir para um lugar parecido com o lugar que meus livros retratavam, com aquelas pessoas criativas e capazes de propagar literatura.
Já nos aproximamos do OSCAR 2009 e discutir esse filme talvez esteja fora de ocasião. Conduta de Risco foi indicado a sete OSCAR no ano de 2008 levando o de melhor atriz coadjuvante com Tilda Swinton (Karen Crowder). Na época das indicações ocorreu uma divisão na crítica que em parte o enalteceu e em parte o criticou severamente. Eu pertenço ao grupo do meio termo e estou aqui para ajustar, agora longe do calor daquele OSCAR, as reais proporções da qualidade do longa-metragem. Analisá-lo é também uma maneira de revermos o que ocorreu naquele ano, um dos mais confusos de Hollywood nos últimos dez. Fora de ocasião ou não, vamos à crítica do filme.
O filme se passa em meio a um grupo de advogados e mesmo não tendo muitas cenas com audiências ou inquirição de testemunhas é um filme do gênero dos que envolve o universo do Direito e terminam sendo assistidos por esses profissionais (como eu) com grande entusiasmo no mundo todo. Existem muitos bons filmes com tema voltado ao meio jurídico na biblioteca universal de filmes. Algum deles, como O Sol é para Todos (To Kill a Mockingbird, 1962), Doze Homens e uma Sentença (12 Angry Men 1957), Julgamento em Nuremberg (Judgment in Nuremberg 1961), Anatomia de um Crime (Anatomy of a Murder, 1959) são clássicos do cinema de todos os tempos.
O longa-metragem é o filme de estréia de Tony Gilroy como diretor. Segundo afirmam, Gilroy tirou inspiração para o filme enquanto freqüentava escritórios de advocacia para escrever o roteiro de Advogado do Diabo (Devil’s Advocate 1997). Outro grande trabalho do roteirista é a trilogia Bourne estrelada por Matt Damon e que angariou fãs no mundo todo. Tony Gilroy é um nome que será citado futuramente no cinema, com absoluta certeza. Para um filme de estréia conseguiu um sucesso bem acima do esperado, mas não completamente inesperado tendo em face o elenco e o dinheiro investido.
O filme se inicia com um monólogo do personagem Arthur Edens (Tom Wilkinson) que corre em segundo plano enquanto vemos cenas do escritório de advocacia em uma noite de trabalho difícil. A linguagem de Arthur será um dos grandes pontos do filme, ele escolhe os adjetivos perfeitamente e revela a qualidade do roteiro. No monólogo, Arthur compara a sua saída pela porta do escritório ao rompimento de uma “película” ou “líquido embrionário.”
O escritório seria uma “placenta” e Arthurrompia esse “casulo” libertando-se da sujeira que havia dentro dele. “Eu renasci” diz o personagem e continua “o escritório é o ânus de um organismo cuja única função é expelir veneno”, “estive coberto dessa merda toda a vida”. São as declarações que faz ao seu amigo e protagonista do filme Michael Clayton (George Clooney) quanto este o visita na delegacia por causa do surto de Arthur durante uma audiência.
A história do filme envolve uma companhia ligada ao agronegócio, a U/NORTH, com. um total de 70.000 funcionários espalhados em mais de 65 países. Um herbicida produzido pela mesma seria agressivo ao organismo humano e teria provocado a morte de diversas pessoas (e doença de uns outros tantos) em uma pequena comunidade nos EUA. O resultado da tragédia é uma ação coletiva por indenizações no valor de 3 bilhões de doláres. O escritório de Arthur, Michael e Marty Bach (Sydney Pollock) é o responsável pela defesa da empresa de agrotóxicos. Ocorre que o advogado Arthur Edens (Tom Wilkinson), maníaco-depressivo com problemas pessoais, enlouquece durante uma audiência e revela informações em desfavor de seu cliente. Além disso, Arthur também começa a juntar provas contra o seu cliente (U/NORTH), pondo em risco a sua vida e os rumos do processo. Por envolver o tema de capitalismo selvagem e indústrias carniceiras o filme foi comparado a Erin Brockovich (2000) e O Informante (The Insider, 1999). O processo é carregado pelo escritório há sete anos com protelações para cansar os querelantes e promover um acordo de baixo custo à empresa.
A trama central do filme é intercalada por cenas da vida particular de Michael Clayton, sua separação difícil e a relação com o seu filho de oito anos. A intenção é desenvolver o personagem, que é de fato complexo e guiado com maestria por George Clooney. Michael Clayton é também viciado em poker e deve dinheiro a agiotas por causa de um negócio mal sucedido no ramo de bares. Ele é longe de ser um herói, talvez não chegue a ser um anti-herói, é somente uma pessoa ocupada demais com seus próprios problemas e sem tempo para heroísmo. Não se importa se a causa envolvendo a U/NORTH é suja ou não, apenas quer resolver seus problemas financeiros e pessoais. Refere-se a si mesmo como "faxineiro" que limpa a sujeira dos seus clientes "donas de casa assaltantes e políticos pervertidos". Arthur começa a inserir na ocupada consciência de Michael preocupações de natureza ética que terminam por influenciar um discurso que faz ao seu filho sobre caráter. Contudo, ao ouvir o primeiro discurso de Arthur sobre a sujeira do caso U/NORTH, Michael surpreende-se dando a mínimo interesse para questões morais relacionadas com o seu trabalho e considerando toda a confusão criada por Arthur como um resultado da doença mental do mesmo, como se fosse um devaneio questionar-se sobre a ética em assumir ou não determinada causa e a responsabilidade decorrente disso. Michael Clayton é um advogado sóbrio que conhece o seu papel em um processo e na vida, com realismo. O enrendo é não-linear como muito tem se visto, sem contudo se basear no recurso fortemente.
A câmera do filme costuma focar os personagens bem de perto, muitas vezes escondendo o cenário, acompanhando as expressões faciais dos mesmos, que parecem não interpretar em busca de um fim. O uso máximo do recurso é na cena final em que a câmera acompanha Michael Clayton ao longo de um passeio de táxi. A trilha sonora é suave, com sons gerados eletronicamente ou fortemente mixados. Quanto às cores, nas cenas com Michael Clayton, costumam predominar cores frias, azuis. Em outras cenas predominam cores esverdeadas, em algumas temos cores mais quentes, talvez nas de Karen Crowder (Tilda Swinton)
Comentando a interpretação de Tilda Swinton que levou o OSCAR, de fato ela é foi competente e deu vida a essa executiva exausta, desequilibrada, relacionada demais com o trabalho e que toma decisões que não são capazes de conviver com sua personalidade, decisões de crime. É um pouco parecida com Michael na questão mesma do realismo e por seus problemas pessoais causarem frieza nas suas decisões de executiva. É uma personagem frágil, apesar de se apresentar no filme no papel mais próximo de uma vilã.
As críticas mais severas disseram que o filme é tedioso e que a trama é pouco explícita exigindo demais do espectador que pode se perder e até retirar a atenção do filme, que possui pouca ação real, focando-se basicamente em seu roteiro. De fato é possível que isso, um verdadeiro desastre, aconteça em Conduta de Risco. A trama realmente requer muito cuidado por parte do espectador e o roteiro e sua execução, nesse sentido, sofreu problemas graves. A trama central perde-se durante a trama secundária, as vezes nos tornamos insensíveis a recursos do filmes, por ele apelar pouco, como na cena poética em que Arthur caminha pelas ruas da cidade perdido com seus devaneios diante de publicidades imensas da empresa U/NORTH. Contudo, o ideal é que aqui tenhamos um espectador capaz de compreender a trama sem que o filme necessite explicitar, reforçar, dizer a mesma coisa duas vezes.
O que vi nesse filme foram pontos de grande qualidade intercalados com problemas graves, mas que, quando acerta o faz com maestria sendo espelho para muitos outros filmes que pretendam criar personagens realistas e passar a impressão real de humanos que se perde diante das situações "heróicas" demais que os filmes apresentam e que de fato exigem.
Próximo ao fim, na cena ápice, Michal Clayton fala para Karen Crowder (Tilda Swinton) "você tentou me matar, sou o cara que você deveria comprar e você me mata?". E então, Michael realmente se venderia? Pensa o espectador. É possível, ele é tão anti-herói que talvez fizesse isso. É quando então Michael se despede, depois de revelar-se um herói, respondendo a um homem que pergunta quem ele é: "Sou Shiva, Deus da Morte".