sexta-feira, 19 de setembro de 2008

O Ateneu, releitura e capas

O segundo livro que decidi comentar (ver postagem anterior) é uma obra nacional: O Ateneu. Achei-o à venda em uma banca de jornal por cinco reais. Edição simplíssima, de folhas finas, aproveitadas nas margens até as últimas consequências, com uma pintura do artista russo Valentin Alexandrovich Serov como capa. É uma releitura, o romance fez seu marco nos meus 13 anos.

O romance e o começo da minha juventude se confundem. Lendo-o, agora, quase ressuscito o garoto que fui, reativando aquela antiga subjetividade de sonhador, de alienígena, de estrangeiro. Para o protagonista Sérgio o Ateneu é uma crônica de saudades, da mesma maneira o é para mim. Agora releio o livro e sinto as antigas paixões que sentia, o romance acabou por se tornar uma maneira de recordar sentimentos do passado.

Um pouco sobre a capa da minha edição:

A imagem de capa da minha edição é uma pintura que retrata dois meninos na sacada de um prédio a observar a costa. O primeiro garoto admira a paisagem, enquanto o segundo observa o espectador, um pouco de soslaio. A imaginação, personalidade, universo e comportamento infantil acabam por ser centro da pintura. Boa parte da graça está nas personagens em cena, como de costume em Serov que é capaz de manter uma técnica exemplar nos cenários ao mesmo tempo em que cria expressões complexas nos seus personagens. Tanto a observação elegante que o garoto faz, com a mão no queixo, quanto o céu à frente dois mantém o mesmo nível de expressão em complexidade.

Decidi pesquisar e descobri que uma outra edição nacional adotou a gravura de uma edificação escolar. Entre a edificação e o Serov, prefiro o segundo. A gravura de uma edificação escolar à moda do prédio do Ateneu teria deslocado minha atenção dos alunos para a escola, de Sérgio (protagonista do romance) para o Ateneu. Ou seja, teria me atentado menos nas construções psicológicas menores e mais no ambiente microssocial da instituição, e desligado-me ainda mais das crianças e jovens que constroem, com sua criatividade, a realidade interna das instituições de ensino.

Uma outra capa que encontrei traz uma pintura que retrata um grupo de garotos, com idades diferentes, envolvidos na leitura de um bilhete que o mais velho traduz em voz alta. Não reconheço o artista, mas chego a sugerir que é provavelmente do começo século XX e atirando realmente às cegas, notavelmente realista. Seria adequado para a capa de um livro de Dickens. A condição social desses garotos é muito diferente da que temos no Ateneu e as roupas que eles usam revelam que são garotos libertos, soltos no mundo.

(..)

Termino com os comentários sobre as capas do Ateneu por aqui, o tempo que passei longe do blog, por força maior, fez com que me distanciasse demais das anotações que tinha sobre o livro. Minha memória das impressões do mesmo também já fugiram. Quem sabe reabra este tópico no futuro. Com o avanço no estudo de filosofia aos poucos me tornarei ainda mais capaz para criticar literatura, o que pode fazer da pausa uma boa medida.

Contudo, posto algumas anotações sobre as personagens que tinha no meu caderno, sondagens não muito profundas, assumo. Com o tempo melhorarei. Invejo os estudantes de psicologia, por exemplo, porque as técnicas de análise permitem um estudo mais apurado de personagens da literatura (assunto que pretendo fazer virar uma postagem em breve), mas como faço sempre nessas horas, repito a mim mesmo que sou filósofo e aí que deve residir a minha graça. A meu favor também conta um princípio vingente desde os idos iniciais da arte moderna: a liberdade cada vez maior do intérprete. Aí vão as anotações:

"Aristarco: imenso pedagogo, hipócrita, autoritário, mantém o jovem Franco em constante humilhação. (...) Na sua aula sobre astros, Sérgio faz uma analogia entre as mãos de Deus e as de Aristarco ao mover os planetários". "moralista, faz longo discurso sobre a moral" "representa a decadência moral da sociedade de então, seu falso moralismo". (...) "lê livros com as notas dos alunos em ritual aterrador" (...) "é representação da pedagogia de então"

"Sanches: que já é púbere, pede beijo a Sérgio" "Sérgio o repreende e termina a amizade, começando um longo declínio em suas notas que dependiam da ajuda de Sanches" (...) Aristarco lê em humilhação pública: "Sr. Sérgio tem degenerado" Sérgio compara Aristarco a Zeus."

Franco: Aristarco o chama de "o porco, o grandíssimo porco"

"filho de Aristarco se nega a apertar a mão da princesa, é republicano como o autor"




(suspenso)